As palavras me escapam. Fogem
como se brincassem de esconder, contornando os precipícios abertos pelas
respostas, sem medo de serem encontradas, muito menos de caírem no abismo do esquecimento.
Elas sabem que são necessárias e que eu as procuro insistentemente, em uma
brincadeira que por tantas vezes me deixou exausta, outras tantas a ver navios
- destes que zarpam assim, com um batalhão de palavras - justo aquelas que
tanto eu queria pronunciar - e que parecem fugir só pelo simples prazer de
plantar em mim o desespero.
Eu já me vejo gritando ao longe,
na beira do cais, pedindo para que voltem, que voltem para me dar sentido, que
voltem para me dar explicações. Não há explicação sem palavras. E elas,
danadas, me abanam rindo, jogam beijos no horizonte e somem, sem avisar quando
retornam para preencher meu vocabulário. E como me dói ficar sem palavras. Gosto
de colecioná-las aos montes e, quando uma me escapa, eu sei que é a punição
pelo tempo que as deixei trancafiadas, pelo tempo demasiado com que as poupei,
ao ignorar que palavras foram feitas para serem escritas ou ditas e - mimadas
como são! - basta um pequeno deslize, o esquecimento de uma delas em alguma
gaveta do tempo, e elas escapam sem piedade, em busca de alguém que as empregue
sem medo. Que as empreguem em vão ou não.
Inconsequentes como quem não sabe ouvir um "não", às palavras pouco importa se são usadas para ferir ou para agradar, para
praguejar ou adorar a vida. Elas querem transbordar ao tempo frenético dos
ponteiros, apenas pelo prazer de se verem escritas, de se ouvirem pronunciadas
num sopro em qualquer direção - e vejam, competem entre si! - para ver quem é
utilizada mais vezes. E eu, ora, eu sei que não fui o melhor reservatório de
palavras. E eu sei que as poupei em demasia, eu sei que engoli o que podia, e
que guardei respostas demais em mim. Pois foi longo o tempo em que tive a
certeza de que o ar da minha fala era vento fraco demais para afastar tamanho
temporal.